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domingo, 22 de agosto de 2021

O DIA DO FOLCLORE OPORTUNIZA REVISITAR A SABEDORIA DO POVO MARANHESE

No Maranhão, estado rico em histórias, lendas e tradição, o folclore se mantém vivo e pulsante, mágico e misterioso e revela a sabedoria de seus moradores.

O Dia do Folclore serve para proteger as manifestações das criações populares e divulgar e estudar a cultura brasileira. (Foto: Divulgação).

Quem nunca ouviu uma história quando era criança de seus pais ou professores sobre animais sem cabeça ou homens com os pés virados? Essas histórias são apenas contos que fazem parte do folclore de nosso país, o que nada mais é do que um conjunto de conhecimentos integrados entre um povo que os transmitem através de costumes, crenças, músicas, danças, lendas e etc, tudo contribuindo para a cultura da região.

De acordo com o decreto nº 56.747 de 1965, a data 22 de agosto foi escolhida porque foi neste dia que a palavra “folklore”, vinda da língua inglesa, foi utilizada pela primeira vez em 1846. O arqueólogo britânico William John Thoms a criou enquanto escrevia uma carta usando os radicais “folk”, que significa povo, e “lore” que significa sabedoria. Desde então a data serve para proteger as manifestações das criações populares e divulgar e estudar a cultura brasileira.

Os estados do Brasil são ricos em cultura, cada um com suas crenças próprias e histórias para contar, e o Maranhão não seria diferente. As influências africanas e europeias tiveram grande impacto da cultura estadual o que resultou em costumes, entre eles, o tradicional bumba-meu-boi que, apesar de ter variações entre os municípios maranhenses, sua essência sempre gira em torno da celebração da ressureição de um boi. Essa dança popular existe em outros locais, mas tem maior representatividade no Maranhão, principalmente durante as festas juninas.

Outra dança que se destaca é o Tambor de Crioula, envolvendo canto e percussão de tambores, não possui uma data ou hora específica para acontecer, mas é mais notória sua presença no carnaval e nas festas de São João. Ao som de tambores feitos de troncos de árvores, os homens tocam enquanto as mulheres dançam em roda, normalmente junto com a imagem de São Benedito, a quem a dança honra.

Apesar das danças serem o grande destaque, as lendas também circulam na mesma velocidade. Ana Jansen, uma mulher rica do século 19, é o tópico principal de uma delas. Vindo de família humilde, ela se tornou influente após se casar virando uma política rica, mas junto com a riqueza vieram boatos sobre sua crueldade com seus escravos. A lenda conta que, por causa de sua longa lista de pecados, ela foi condenada a vagar em uma carruagem assombrada pelas ruas de São Luís e, até hoje, os ludovicenses tem medo de encontrar a alma penada de Donana, seu apelido.

Além da carruagem de Ana, a serpente também tem muita força entre os habitantes da ilha. É dito que um réptil enorme vive nas áreas subterrâneas da cidade e cresce a cada dia até que sua cabeça, localizada embaixo da Fonte do Ribeirão, irá encontrar sua cauda, localizada na Igreja de São Pantaleão, fazendo a ilha afundar. A capital maranhense possui diversas histórias para contar, cada uma com suas peculiaridades que formam a cultura local.

A população do estado demonstra grande afeição ao folclore local e nunca deixa de homenageá-lo sempre que podem. Anderson Lopes, historiador em formação na UFMA (Universidade Federal do Maranhão) de 27 anos, faz parte dos apreciadores da cultura local, afirmando que o folclore não é algo que envolve apenas o passado e sempre está ligado na nossa vida. “Ele é importante porque diz muito da nossa identidade, o folclore é muito repassado por via oral. Me interesso muito pela área porque está interligado com meus estudos já que sou pesquisador de história”, conta. “A cultura também se manifesta inconscientemente, então o homem como ser cultural tem essa necessidade de manter os seus valores. Querendo ou não o folclore vai ser repassado independentemente das mudanças culturais, e sim, devemos preservá-lo constantemente”, diz o historiador. Ele conta que as manifestações do folclore também estão ligadas aos povos indígenas, assim tendo mais motivos para serem preservados.

Anderson afirma que a cultura popular sempre teve um espaço presente nas escolas para ser ensinada de forma simples, pelo menos até 2008 quando a lei 11.645 entrou em vigor, ditando que o ensino de história e cultura deve ser obrigatório nas escolas, fortalecendo os estudos sobre o assunto nos municípios brasileiros.

O historiador acha necessária a existência de mais projetos que abordem a cultura local por se tratar da identidade de um povo, algo que deve ser repassado no formato de conhecimento.

Cristopher Rocha – IMPARCIAL.

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sábado, 25 de julho de 2020

25 DE JULHO: DIA DE RESISTÊNCIA DAS MULHERES NEGRAS LATINO-AMERICANAS E CARIBENHAS

Wikimedia Commons - 25 de julho foi reconhecido pela ONU como o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha.
Data é um momento de reflexão e discussão sobre estratégias e desafios para superar o racismo e as violências sobre as mulheres negras.

Grupos femininos negros de mais de 30 países da América Latina e do Caribe se reuniram em 1992, em Santo Domingo, na República Dominicana, para discutir as violências raciais e de gênero que sofriam. Após a reunião, essas mulheres negras lutaram para que a data 25 de julho fosse reconhecida como o Dia Internacional da Mulher Negra latino-americana e Caribenha.
Esse dia de resistência foi ratificado pela Organização das Nações Unidas (ONU) e simboliza as experiências das mulheres negras, que reivindicam suas lutas e traça os desafios impostos pela sociedade. Para a historiadora Bruna dos Santos, o dia é um marco para evidenciar a existência dessas mulheres enquanto grupo político.
Em entrevista a Opera Mundi, a militante da Marcha Mundial das Mulheres do Rio Grande do Sul afirma que é impossível discutir qualquer questão de política sem que "perpasse pelo olhar de mulheres negras". "As mulheres negras sempre estiveram reivindicando e participando dos processos sociais e políticos, e por isso, precisavam de um movimento como esse, que desse conta de suas demandas", disse. 
Segundo Santos, a data internacional permite mostrar que esse grupo "existe" e que "compõe a sociedade tanto no sentido de suas ações individuais, quanto em ações coletivas".
A data é celebrada por diversos movimentos e coletivos que organizam encontros e marchas nas ruas de diferentes cidades e países. No entanto, devido à pandemia do novo coronavírus, algumas organizações tiveram que mudar a estratégia, como o caso da Marcha Mundial das Mulheres do Rio Grande do Sul, que convocou militantes e realizou uma jornada de publicações em um site
De acordo com Claudia Prates, uma das organizadores do site, a ideia era trazer as mulheres que compõem as marchas nas ruas para dentro do virtual, dando dicas de filmes, livros, músicas, documentários e outros conteúdos que têm a mulher negra como protagonista. 
"Fizemos montagens com falas das mulheres e divulgamos em nossas redes sociais. É uma forma de que esse conteúdo possa alcançar várias pessoas, além de ser um espaço para estimular que outras mulheres possam estar escrevendo sua história e seu lugar de fala", afirmou.
Tereza de Benguela
Aqui no Brasil, a ex-presidente Dilma Rousseff sancionou, em 2014, a lei nº 12.987, que estabelece o dia 25 de julho como o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra. A medida visava reconhecer o papel de Tereza de Benguela e resgatar a memória da líder quilombola durante o século 18.
Ao Opera Mundi, a socióloga Suelen Gonçalves enxerga a líder como uma "heroína" brasileira que resistiu "bravamente contra a desumanização e ataques ao território quilombola".
"Pensar esse dia nacional é valorizar esta história de resistência dessas mulheres negras, que estiveram presentes em muitos momentos da história", disse. A militante do coletivo Atinukes - Sobre o pensamento de mulheres negras aponta que essas histórias de lutas não são contadas "de uma forma oficial". 
Segundo ela, a data é um momento de reflexão e de "celebrar a nossa trajetória de construção histórica". "O Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra tem um peso importante de reflexão de que sociedade nós queremos. Qual o novo pacto civilizatório que nós vamos construir para viver e viver com dignidade", afirmou.
Do Opera Mundi
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terça-feira, 11 de setembro de 2018

LULA, HADDAD E O POVO BRASILEIRO - CORDEL

Lula, Haddad e o Povo
Por Reginaldo Veríssimo

O melhor presidente do Brasil
Sofre vergonhosa perseguição
Estrategista como Virgulino
Lula a Haddad passa a missão
Para salvar o país do confisco
Como dizia o valente Corisco
--Sou um cabra de Lampião

--O golpe me encarcerou
Haddad é minha indicação
Uma ideia não se apreende
Por mais fornido grilhão
Não sou nenhum maluco
Sou filho de Pernambuco
Assim como o Lampião

A elite fingida não perdoou
Na minha administração
Negro e índio virou doutor
Pau de arara andou de avião
Na urna ninguém me enfrenta
Haddad hoje me representa
Ele é minha ressurreição

Chamam-me de analfabeto
Pelo mundo fui condecorado
Nisto tem muito de inveja
Da rançosa elite do passado
Donde a direita é resultante
Haddad é meu representante
Com ele é golpe noucateado

IILula, Haddad e o Povo

Sou uma vítima inocente
Deve ser uma provação
Afastaram-me das ruas
Os golpistas de plantão
FHC e a sua pinguela
Com Haddad e Manuela
Venceremos esta eleição

Amargo uma prisão política
Está mais do que provado
Mesmo sem nenhuma prova
Fui velozmente condenado
Assim recomendo Haddad
Desde o campo até a cidade
Pra nesta eleição ser votado

Jaz um judiciário nocivo
O Direito se fez político
A toga condenou o povo
Trocar trabalho por bico
Haddad traz a esperança
É mais comida na pança
É a mensagem que indico

O golpe segue sua narrativa
Minha ideia voa como pluma
As togas negras recrudescem
Nos tribunais não ganho uma
O TSE nem a ONU obedeceu
Fernando Haddad vai ser eu
A vitória do bem se avoluma

III. Lula, Haddad e o Povo

Com os Trópicos agitados
2013 inicio da manipulação
A Democracia se balança
O judiciário avança a mão
O legislativo uma bomba
Onde deputado rir e zomba
Rasgaram a Constituição

O fascismo vai ter baixa
O entreguismo cessará
Lula agora é uma ideia
Que se propaga pelo ar
Indica Fernando Haddad
Um cidadão sem maldade
Para esse Brasil restaurar

A nação foi sabotada
O epicentro em Brasília
Forjaram um impeachment
Cunha liderava a matilha
“Com o STF e com tudo”
Esse tribunal ficou mudo
Temer chefia a quadrilha

Rapinas o país destruíram
Por desculpas a corrupção
Na verdade os sem votos
Querem mandar na nação
É um desenfreio sinistro
Juiz enquadrando ministro
Só Haddad tem a solução

IV. Lula, Haddad e o Povo

Venderam nosso pré-sal
Queimaram a cê ele tê
Os royalties da educação
As crianças não vão ter
Por isso Lula é Haddad
Com toda a integridade
Para tudo isso reverter

A dilapidação é crescente
A Eletrobrás está na mira
A Embraer foi negociada
Na Globo só sai mentira
Lula disse para Haddad
--Vá e só fale a verdade
Essa é tua ninguém tira

O preço do gás nas alturas
14 milhões sem ocupação
A gasolina sobe todo dia
Pro pobre restou o carvão
E uma carrada de maldade
Por isso Lula traz Haddad
Pra resolver esta questão

Lealdade para mim é verbo
Diz Haddad ao professor
--Tenho formação política
Na academia sou doutor
Direito, Economia e a bula
Aprendi com o velho Lula
Como ser um bom gestor

V. Lula, Haddad e o Povo

Não se esquecer dos pobres
Uma lição que levo a sério
Fui gestor de São Paulo
Na educação, o ministério
Deixei 100 bi de orçamento
Não descuidei um momento
Só com técnica e critério

Haddad é um cara do bem
Diz Lula para sua gente
--Podem votar sem medo
Nesse jovem e inteligente
Vai fazer o que eu disser
Vai empoderar a mulher
Botar o Brasil pra frente

Faremos o Brasil crescer
Para isso não tem estorvo
Vai ser uma nação plural
É Lula, Haddad e o povo
Gerando emprego e renda
Casa ao invés de tenda
É o Brasil feliz de novo

--Do cárcere dou as cartas
Fiz disso a minha missão
Não renuncio a dignidade
Em catedrático dou lição
É Corrida em revezamento
A Política o instrumento
Pra Haddad passo o bastão

Teresina (PI), 07 de setembro de 2018.
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terça-feira, 21 de agosto de 2018

A LEITOADA DOS FILHOS E AMIGOS DE BURITI

A leitoada foi uma festa e tanto, digna de aplausos de pé e demorados, citação esta apreciada pelo conterrâneo José Deusaniro de Faria Freitas Júnior, o Deusanirinho, uma espécie de reverência que ele faz quando algo lhe agrada.  Festa jamais vista por estas bandas, ganhou corpo em torno da polêmica relativa ao sumiço de uma leitoa, iniciada quando o animal estava a ganhar peso em um chiqueiro de conhecidos, de onde desapareceu, e que seria sacrificada numa festa de amigos, por ocasião dos festejos de Nossa Senhora Santana em Buriti de Inácia Vaz, ou só mesmo Buriti, nome oficial da cidade.

Em razão da grande dimensão deste fato que ganhara as redes sociais, principalmente na plataforma digital do aplicativo batizado por WhatsAAp, mensageiro mais popular do país, o que seria um encontro de gatos pingados, transformou-se numa grande festa chique, regada a uma culinária típica das terras de Inácia Vaz, diversificada e farta, teve leitoa assada e guisada, panelada, feijoada, galinha caipira, churrasco, arroz branco, de pequi e baralhado, cerveja, refrigerantes, principalmente o Jesus, música ao vivo[i], ideia materializada por Odilene, e outras coisitas mais, como a distribuição do brinde do chaveiro da leitoa, inclusive poesia[ii] fechando o cardápio.

Agendada com antecedência para o dia 23 de julho, auge das comemorações católicas da city, em função da padroeira local, momento em que a maioria dos buritienses forasteiros pudessem estar presentes, o furdunço realizar-se-ia no Bar do Careca, figura que ficou conhecida neste episódio como um dos fiadores da abdução da leitoa, mas o grande rega-bofe mesmo terminou por acontecer na bela e aconchegante chácara da professora Valdilene, que além de ceder o espaço também, literalmente, meteu a mão na massa, com a disposição que lhe é inerente.

E por ironia do destino ou mesmo para livrar-se das indiretas, o Careca vendeu o bar, e segundo ele próprio, o comprador exigiu as chaves no exato no dia da festança. Mas nem assim o esperto vendedor se livrou das acusações as quais temia, como é amicíssimo do Odair do Faquinha, o dono da leitoa da confusão, não teve como recusar o convite do dileto primo, pois passou a festa inteira sendo achincalhado pelos colegas, mas é claro por pura diversão. Outro implicado no convescote clandestino, o Maspim, não se importava com as pilheras[iii] a ele dirigidas, presente desde o início, ao contrário de David, seu filho, que sequer compareceu.

O evento ganhou volume, comando e organização a partir dos integrantes do núcleo do coletivo do WhatsApp, denominado Filhos e Amigos de Buriti, citado alhures. Convidados os familiares e a quem mais se dispusesse a marcar presença. A galera compareceu em peso. Os originários do grupo, felizes, vestiam camisas comemorativas e tudo. Deusanirinho, um dos pais do evento, das suas listas de serviços, vieram as contribuições, os pratos típicos, disso nasceu poesia de cordel que virou banner, por ele mesmo interpretada, muita comida, bebida, musica, conversa amiga e diversão, teve até a loção do Armando[iv] e Renardo Almeida no violão.

Confraternização, celebração de amizades, convívio mesmo que por efêmeros instantes, são os reais e verdadeiros motivos de uma festa como essa. O factoide da leitoa do Odair, nesse aspecto, cumpriu a função social de ponte, de caminho, de interligação, um acesso, um atalho para uma motivação maior, qual seja, a gratificante interação transmutada das telas digitais dos smartphones em forma de mensagens de áudio ou de dados, que mais isolam do que incluem, para o corpo a corpo, para o ao vivo, para o tete a tete, proporcionando muitos significados, aromas, paladares, audições, visões e quem sabe toques já esquecidos que só ali puderam ser rejuvenescidos, é a incessante busca pelo enigma.
A leitoada mesmo com a mudança de local de última hora, não deixou nada a desejar, o sítio da Valdilene nos proporcionou ambientação saudável, todos puderam exercer suas performances individuais e coletivas como bem lhe aprouvesse, sem constrangimentos, seja no prato com a leitoa assada ou cozida, na mesa de conversas, dançando com seus pares, ouvindo músicas bacanas, poesia de cordel, discursos de agradecimentos, roteiro para novos encontros e cerveja gelada, item que deve sofrer adaptações. No mais foi um golaço. Parabéns a todos os filhos e amigos de Buriti, direta e indiretamente, envolvidos na organização dessa belíssima festa. Que venham outras e outras mais.


[i] A música da leitoada esteve a cargo da banda H3 de Coelho Neto.
[ii] O cordel que relata os fatos sobre o sumiço da leitoa do Odair, é intitulado de “A abdução de uma leitoa a la Buriti”, de autoria de Reginaldo Veríssimo.
[iii] Coisa que se diz com o intuito de ser engraçado; graça, piada: não havia quem não fizesse uma pilhéria sobre a situação da leitoa abduzida.
[iv] Trata-se de uma infusão malcheirosa que o Armando Machado costuma lambuzar invariavelmente o pescoço dos presentes, nas festas que participa.
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domingo, 11 de fevereiro de 2018

O Alambique de Maria Izabel, por Walnice Galvão*

Maria Izabel e seu alambique
Dona Maria Isabel, esta aí da imagem, ocupou o pódio de conferencista outro dia, no Centro de Pesquisa e Formação do Sesc SP, uma espécie rara: uma mulher fabricante de cachaça. Ou, em suas próprias palavras, uma “cachaceira”.
Esta raridade vem de Paraty, onde planta cana em curvas de nível no sítio à beira-mar Santo Antonio, passa-a pela moenda, destila-a no alambique, engarrafando e vendendo a cachaça de primeira e com appelation contrôlée (como dizem os franceses) que leva seu nome: Maria Izabel.
O nome, tal como figura no rótulo, já é todo um romance. Não tão narcisista, conta que tentou registrar o nome de Santo Antonio, que é o do sítio. Entretanto, todos os nomes de santo já estavam tomados. Um dia, chegando a um boteco de beira de estrada de fregueses seus, ouviu uma discussão sobre “a Maria Izabel”, e achou esquisito até perceber que a discussão era sobre a cachaça, não sobre sua pessoa: a cachaça já tinha nome na boca do povo.
Faltava o rótulo, que acabou tendo ilustre linhagem. Quem o criou, por gentileza de Liz Calder, fundadora da editora inglesa Bloomsbury e veranista de Paraty, foi o designer Jeff Fisher, ilustrador da saga de Harry Potter, florão da editora. Bem naïf, mostra uma paisagem tropical paradisíaca. Liz Calder, afora tudo isso, é também a criadora da Flip, ou Festa Literária Internacional de Paraty.
A conferencista conta com muita simplicidade que não decidiu mudar o mundo nem fazer uma grande bebida, mas começou plantando cana nesse pedaço de chão de apenas 4 hectares, na baía de Paraty, e, de passo a passo e quase sem perceber, quando viu estava fabricando uma excelente cachaça.
Não chegou lá sozinha, mas procurou produtores experientes de outros engenhos, consagrando-se à preciosa aprendizagem. Um deles foi o finado Pedro Peroca da Fazenda do Fundão, que lhe ensinou a técnica secreta da fermentação, que ela, em atenção a ele, não divulga de jeito nenhum.
Passou a experimentar diferentes barris e diferentes madeiras, até acertar em duas: o jequitibá que interfere menos e o carvalho que interfere mais, nos quais a bebida repousa no mínimo por um ano.
Faz questão de que tudo seja orgânico e biológico, com aproveitamento total. O bagaço da cana moída e o vinhoto vão adubar a plantação. Mantem uma enorme composteira, onde recolhe todo o lixo que sobra do processo, somado ao da casa e ao do galinheiro.   
Dá conta de tudo com apenas quatro funcionários; mas ela mesma não tem medo de trabalho e põe mãos à obra o ano inteiro, mais no período da safra anual, menos na entre-safra. Só o processo obrigatório de limpeza todo ano de todas as fases do processo – alambique e artefatos de apoio – para evitar a formação do óxido de cobre ou azinhavre, venenosíssimo, já é pesado. Tudo é areado com devoção e cuidado. A serpentina, que devido a sua forma e calibre não pode ser esfregada por dentro, é lavada com suco de limão-cravo (tal como nossas avós faziam com os tachos de cobre, adicionando sal), de que são necessários 40 litros por vez, o que obriga Maria Izabel a plantar limoeiros e armazenar os frutos, inclusive congelando-os.
A melhor cachaça, diz ela, é aquela feita com cana recém-cortada e, portanto, não estocada. Porque se demorar um pouco, a cana já começa a fermentar e resulta em acidez. Todo o processo exige rigor e pureza absoluta, porque qualquer imperfeição vai incidir sobre o gosto final.
A produção é pequena, variando entre 6 e 8 mil litros por ano, mas ela não tem intenção de aumentá-la, porque isso implicaria em abdicar do critério artesanal e da qualidade.
Ultimamente está tentando obter aprovação oficial para o resgate de uma preciosidade, a Laranjinha Celeste, denominação que descobriu nos papeis de seus antepassados “cachaceiros”. Trata-se de uma cachaça destilada com folhas de mexerica, que lhe conferem um perfume especial e a tornam azulada: donde o lindo nome. Antigamente, ela era fabricada por seu mentor e mestre, mas foi-se com ele. Ele era famoso pela “Azulada do Peroca da Fazenda do Fundão”, rótulo que é a soma de duas redondilhas maiores, esse verso típico da poesia lusobrasileira. Tomara que consiga.
*Walnice Nogueira Galvão é Professora Emérita da FFLCH-USP
GGN
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terça-feira, 17 de outubro de 2017

A saga dos Ferraz e a melhor cachaça do Maranhão

Casa sede do engenho Ferraz. Fotos: Reginaldo Veríssimo
O alambique Paulino Ferraz localizado no povoado Olho D'água do Tolentino, no município de Santo Antonio dos Lopes, em atividade desde o início da década de 1930 do século passado, fabrica artesanalmente uma das melhores pingas do Maranhão, a produção de cachaça dos Ferraz já está na terceira geração, caminhando para a quarta.

O negócio teve início com o senhor Joaquim do Sítio, originário de Picos no Estado do Piauí, que por volta de 1930 se estabeleceu numa pequena gleba de terras denominada Quinta do Deó, adquirida do proprietário de mesmo nome que também cultivava cana de açúcar para fabricação de aguardente. 
Paulino Ferraz com a mão na massa. 
Joaquim, o pioneiro dos Ferraz, repassou todos os conhecimentos acumulados ao longo dos anos na produção do destilado aos filhos, que por sua vez multiplicaram para os demais descendentes. No início o engenho era movido a tração animal, puxado por bois criados ali mesmo, mais tarde a motor de explosão, hoje é uma máquina movida a energia elétrica, ofertando maior produtividade ao empreendimento. 
Máquinas (motor e moendas). 
Vale lembrar que o primeiro motor dos Ferraz, era alimentado a óleo diesel, foi comprado no início dos anos de 1970, pelo senhor Paulino Ferraz de Sousa ou só Paulino Ferraz, de segunda mão, com mais de 30 anos de uso, em Pedreiras, do herdeiro de um antigo produtor rural, adquirido diretamente  da Escócia. A velha máquina é uma relíquia da família.
  Paulino pai com os filhos, Paulino Filho, Flávio e os amigos Jadiel e Nonato DJ.
O seu Paulino Ferraz é um típico sujeito feliz, alegre que gosta de gente, vive rodeado dos filhos, netos e amigos, conta piadas como ninguém, como também gosta de ouví-las. Conta ele que certa vez viajando numa excursão para Sucupira do Norte, aqui mesmo no Maranhão, acompanhado de amigos como Jadiel França, Nonato Alves, o DJ, este último contador de Piadas.

Sucede que Sucupira, o destino final da caravana, fica a alguns quilômetros depois da entrada para a cidade de Jatobá. Nonato, então, se assenhorou de navegador, não podia ver uma entrada ou uma bifurcação da estrada, que se punha a dizer é a entrada do Jatobá, passaram-se todas as entradas, e nada dele identificar a entrada de Jatobá, daí em diante falar em Jatobá ali era uma graça, puxada invariavelmente por seu Paulino, que até hoje dar gargalhas quando lembrado desse episódio.

Voltemos então a história dos Ferraz envoltos com a melhor pinga da região, tocada hoje em parte pelos netos do fundador, vez que seu Paulino com 68 anos de idade, completados no último dia  22 de junho, é duro que só as moendas do velho engenho, administra o alambique em parceria com os filhos: Flávio, Paulino Filho e Francisco Ferraz ou Bida, o cambiteiro do engenho, esse sabe tudo de cambito, cambita lenha, cambita cana, cambita até quem tiver por perto, função por demais importante porque se o Bida nâo cambitar não haverá garapa para alambicar. 

Com critério, paladar refinados, o velho e os novos Ferraz: Flávio, o mecânico, químico nas palavras de Nonato DJ e Paulino Filho fazem daquelas terras, da antiga Quinta do Deó passadas nas moendas, dornas, coxos, serpentinas dos alambiques em brasa e muito suor, uma das cachaças mais apreciadas de todo médio Mearim, quiçá do Maranhão, com uma produção atual estimada em torno de 18 mil litros ano.

Paulino, o pai, faz questão de se ombrear com os mais novos da família na lida, apesar da idade é um gigante, executa todas as tarefas com a maior energia. Rapadura, mel e batida são outros produtos do engenho dos Ferraz, produzidos mais para  subsistência uma ou duas vezes por ano. Essa tarefa é encabeçada e dirigida exclusivamente por ele, por ser trabalhosa e pouco rentável, os filhos não se interessam muito por essa atividade. Esse é o nosso testemunho, um naco da saga dos Ferraz no Maranhão.

Por Reinaldo Veríssimo 
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segunda-feira, 9 de outubro de 2017

O cadáver do Reitor explica o sentido da Operação Ouvidos Moucos, por Armando Coelho Neto

Com perplexidade, li a sinistra nota da Associação dos Juízes Federais do Brasil (AJUFE), em conjunto com a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) e a Associação dos Juízes Federais de Santa Catarina (AJUFESC).  Nela, registram que, ao mesmo tempo em que lamentam a morte do reitor Luiz Carlos Cancellier e se solidarizam com a família “nesse momento de dor”, vêm a público repudiar afirmações de eventuais exageros na Operação Ouvidos Moucos.

​O sinistro começa por aí. Não enxergam exagero algum numa ciclo de ações que soam como represália coronelesca das brenhas. A ação em tela é só mais uma, num conjunto de outras, que não precisam ser enumeradas. Genericamente, os desastres das operações da PF, não raro com endosso do Ministério Público Federal (amparadas por ordens judiciais), de há muito têm ares grotescos. Faz tempo que até o suspeitíssimo Gilmar Mendes fala de “prisões espetacularizadas”. Sem embargo, os calendários para desenvolvimento e os vazamentos seletivos por si sós garantem a chancela de ações políticas. A rigor, traduzem a explicita partidarização, nesses tempos de ausência e negação de provas permitidas em direito. Revelam o espírito do golpe e do “Direito Penal do Lula”.

Desse modo, soa grotesco tentar minimizar exageros, sobretudo quando, em que pese o preenchimento de alguns requisitos legais, trazem a marca do voluntarismo subjetivista. Um subjetivismo moralista que se contrapõe à subjetividade da dor alheia espezinhada. O “respeito” que a nota registra em relação à família não foi o mesmo quando a fúria punitiva humilhou publicamente um homem com história, currículo e DNA democrático. Um reitor de universidade foi tratado como rábula, mas, para os oficiantes do moralismo de plantão, isso não é dor. Como dito no texto da semana passada, são ações executadas por pessoas para quem dor é o dedo preso numa porta. Desse modo, a dor em relação à família, em detrimento da dor do então vivo, soa como mera retórica corporativista, de quem está “acima do bem e do mal”.

Não há perdão, já o disse e repito: a Polícia Federal entrou para a história dos golpes, e, o Ministério Público, que deveria ser o fiscal da lei, tem feito leituras de rasas e de conveniências da lei. Basta comparar a postura da Procuradoria Geral da República em relação ao grampo da legítima presidenta Dilma Rousseff (Fora Temer!). O que dizer do endosso ao impedimento de nomeação do ex-Presidente Luís Inácio Lula da Silva para ministro da Casa Civil (Dilma)? O que dizer de caso similar sobre a nomeação de Moreira Franco, cuja secretaria foi transformada do dia para a noite em ministério, em pleno curso de denúncias e investigações? Onde estava o fiscal da lei quando um procurador “designado” pelo panfleto político conhecido por Veja queria se antecipar a Sérgio Moro para prender Lula? Onde estava a tal Ajufe quando Sérgio Moro inventou o “convite coercitivo” para Lula?

Quem matou o reitor foi quem concorreu para a degradação pública de sua história. A vítima não teve direito à subjetividade da amargura, nem à dor com a qual não conseguiu viver. A imprensa jogou sal na subjetividade de uma ferida idiossincrásica. Coisas do limite humano! E agora, cumpre perguntar: quem promoveu a degradação pública de pessoas, destruiu biografias - inspirado numa série de outras similares? Que juiz para proferir uma sentença, ora assume papel de acusador, ora de palestrante formador de opinião pública? Ora assume o papel de vítima, para tentar explicar porque ignora essa ou aquela prova ou falta dessas? Quem tentou prender o acompanhante de uma pessoa com câncer dentro de um hospital? Quem foi prender e quem deu manifestação favorável? Quem foi que, repentinamente, converteu essa mesma prisão de natureza necessária para desnecessária? Quem foi que se escudou num “eu não sabia”, quando Lula (por dedução) “sabia de tudo”?

É preciso contextualizar o suicídio do reitor. O “golpíchment”, viciado na origem, seguiu os trâmites da “maconha intrujada”. Hoje, são fartas as notícias de votos comprados. Viciado “ab ovo”, o estupro à democracia se deu com omissão da suporta “Alta Corte”. Não vi notas de delegados, procuradores e juízes defendendo a moralidade, estado de direito, democracia. Desse modo, soam torpes os argumentos da nota, numa democracia destroçada.  As instituições públicas têm como aliadas uma imprensa corrupta, que se encarrega de preparar o espírito dos leigos para aceitar como normal as ilegalidades  e o autoritarismo em curso, maquiados de pretensa legalidade.
A carta assinada pelos tais operadores do direito traz a marca do “quem usa cuida”. Já que suas ações são politizadas, só lhes resta a insólita conclusão de que debater excessos é politizar a tragédia. Vejam o que dizem: “Ao contrário do que vem sendo afirmado por quem quer se aproveitar de uma tragédia para fins políticos, no Brasil os critérios usados para uma prisão processual, ou sua revogação, são controlados, restritos e rígidos. Uma tragédia pessoal não deveria ser utilizada para manipular a opinião pública, razão pela qual as autoridades públicas em questão, em respeito ao investigado e a sua família, recusam-se a participar de um debate nessas condições”. Como assim?

Haja peroração! “Os integrantes das respectivas carreiras, não apenas na referida operação, como também no exercício de suas demais atribuições funcionais, norteiam-se pelos princípios da impessoalidade e da transparência, atuando de forma técnica e com base na lei”.

É de se perguntar: qual a impessoalidade em ações dirigidas para o Partido dos Trabalhadores, previamente anunciadas para a imprensa? Qual a impessoalidade de um delegado federal que fez campanha para o candidato Aécio? Que dizer de Sérgio Moro em fotos ao lado de João Dória, Aécio Neves, Gedel Vieira, Michel Temer, Geraldo Alckmin? Qual a imparcialidade dos oficiantes da Farsa Jato nesse contexto político?
Ah, tá. “Hoje você é quem manda, falou tá falado, não tem discussão”. Qual a importância de uma tragédia pessoal diante de vossa impunidade e de vosso corporativismo? Sim, sei, “timing é tudo”. A solidariedade às vítimas é condenável, é coisa de "aproveitadores". Só a defesa dos algozes é moral. Como donos da verdade, não toleram contestação. A julgar pela postura, são seres infalíveis, acima do bem e do mal. “Probleminhas em operações acontecem. Fazer o quê”?

Um homem público movido pelo sentimento do injusto se mata e os representantes daqueles que, técnica e genericamente, contribuíram para sua morte, se recusam ao debate. E o mais grotesco: não o fazem "em respeito à família" do falecido reitor.

Pasmem! Não querem a opinião da sociedade em tragédias decorrentes de seus atos - da quebra de empresas à destruição de biografias. Se não querem debater, não querem ouvir ninguém, o silêncio sobre o cadáver do reitor explica bem o significado do nome “Operação Ouvidos Moucos”.

Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista e advogado, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo.

GGN
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